1. Falar de mediunidade
talvez necessite primeiro de explicar o que é que isso significa. Sempre ouvi
dizer que a "bruxa" ajudava as pessoas com os espíritos, sempre achei
que a "bruxa" metia medo e seria alguém muito estranho e por isso,
era bem melhor fugir dela. Vivi numa aldeia do interior do país e falar de
bruxos era como beber um copo de vinho na taberna. Era conversa do dia e da
comunidade. "Benze lá a menina"; "Leva-a à bruxa que ela
passa-lhe o azeite"; "Tem o ventre caído, tens de a levar à
bruxa"... Na verdade a bruxa era o remédio para muitas aflições, apesar de
ser bruxa nunca percebi lá muito bem porque se chamava de bruxa, até porque
imaginava eu, na minha inocência infantil, uma velha como na história da branca
de neve, com uma verruga enorme e corcunda, cheia de maldade e cheia de
poderes.
2. Estas considerações
infantis e imaginárias deixaram a sua simplicidade na minha mente, quando em
plena vivência da minha adolescência comecei a ver espíritos e a comunicar-me
com eles. No meio de uma vida normal, igual a tantas outras, parece que
a imagem da "bruxa" rompeu na minha cabeça, assaltou os meus
sonhos e apoderou-se durante algum tempo, não só de mim mas também da minha
família. No fundo, a "bruxa" era apenas o medo, medo do que se estava
a passar mas, sobretudo, do que poderia vir a acontecer.
3. Começaram as noites
cheias de pesadelos, as noites cheias de medos, as noites cheias de gritos.
Demorei muito tempo até deixar de sentir medo, demorei muito tempo a
compreender a diferença entre o que me era "mostrado" e o que os
outros eram capazes de ver. Pensei (pensámos) muitas vezes que eu estaria a
ficar louca, em procurar ajuda psiquiátrica, mas no fundo a ideia da
"bruxa" não me saia da cabeça. E por isso, lá fomos a uma...vim de lá
com um diagnóstico "...minha senhora, a sua filha tem mediunidade, a
senhora vai ter de procurar quem a ajude, eu infelizmente não consigo, procure
um centro espírita..."
4. Encontrámos um centro
espírita, até nem muito longe de casa e com minha surpresa, cheio de caras conhecidas.
Afinal há muitas pessoas com o mesmo problema que eu, pensei imediatamente.
Depois de compreendermos a forma como funcionava, as regras, lá assistimos a
uma palestra e no final logo nos encaminharam para uma sala escura onde estavam
sentadas várias pessoas numa mesa e outra a passar-me as mãos (sem nunca me
tocar) pelo corpo. Deram-me um copo de água para beber e mandaram-me embora.
Fiquei surpreendida mas com dúvidas, ora, afinal o que se passou ali? Procurava
uma explicação mas saio mais confusa... Cá fora, num corredor alguém me dizia,
Sábado há curso, tens de vir. Curso?
5. Sábado fui ao curso,
aliás fui durante vários Sábados, fui tantos Sábados quantas as noites que não
dormia. Um dia deixei de ir. Pensei que tantos Sábados, tantas Segundas e tantas
Sextas não me estavam a ajudar. Ler tantos livros sobre o que era ser médium e
o que era a mediunidade não me estavam a deixar dormir, que não me estavam a
ajudar com os espíritos que não me largavam. Afinal a ideia não era aprender a
não os deixar interferir com a minha vida, pelo menos daquela forma?
6. Procurei outros centros,
outros médiuns, mais centros, mais médiuns, uns que me enganaram outros nem
tanto. Hoje não sou quem era, hoje não tenho medo dos espíritos, falo com eles
intensamente e ajudo-os com a mesma intensidade. Ajudo quem é vivo e quem não
é. Aprendo com eles e com os necessitam de ajuda, aprendo com o meu grupo a
quem tudo agradeço. Já não me assusto quando me acordam durante a noite, já não
fico a tremer quando sinto a presença ou o vejo, já não sinto dores, ou fico
doente, quando algum me "incomoda".
7. A mediunidade foi e é
para mim, a maior lição da minha vida, a maior transformação que algum dia me
poderia ter acontecido, mas é uma ferramenta ao serviço do bem-estar de quem
sofre e de quem pede ajuda. E no meio de tanta coisa difícil que ela nos
confronta, agradeço por me ter sido possível saber aplicá-la e utilizá-la da
forma que escolhi.
Um abraço fraterno.